Com cada vez mais venenos agrícolas autorizados, aumentam os alertas sobre a exportação de alimentos do Brasil
A política de liberação desenfreada de agrotóxicos pode estar tornando o Brasil um grande distribuidor de venenos agrícolas pelo planeta por meio dos produtos exportados. Recentemente, um estudo alemão do Greenpeace apontou que substâncias proibidas pela União Europeia (UE) estão presentes em frutas cultivadas no Brasil que entram no bloco.
Com uma análise de alimentos consumidos em três cidades da Alemanha, laboratórios especializados identificaram 35 tipos de venenos, 11 deles proibidos por países da UE. Mais de vinte ingredientes ativos encontrados estão no grupo de Pesticidas Altamente Perigosos. 85% das amostras tinham algum tipo de resíduo.
Não há indicativo ou garantia de que o problema não esteja acontecendo em outros países, explica a engenheira agrônoma, Marina Cortêlo, que atua na Campanha de Agricultura e Alimentação do Greenpeace e é porta-voz da pesquisa no Brasil. “Com esse estudo, a gente pode afirmar categoricamente que isso está acontecendo.”
O estudo do Greenpeace Alemanha foi realizado entre a segunda quinzena de abril e o início de maio deste ano, em frutas como manga, limão, mamão, melão e figo. Elas tinham origem em diferentes locais de produção e foram coletadas em diversos tipos de comércio, o que pode indicar um cenário abrangente.
Marina Cortêlo alerta que a interação das substâncias em um mesmo produto ainda tem consequências desconhecidas. Esse “coquetel” estava presente em mais de 60% das frutas analisadas. “É muito grave e não é muito diferente do que a gente tem visto no Brasil”, contextualiza a pesquisadora.
Não é primeira vez que o desembarque de agrotóxicos proibidos é detectado na Europa em produtos brasileiros. Em 2017, a pesquisadora e professora Larissa Mies Bombardi, da Universidade de São Paulo (USP), publicou o atlas Geografia do uso de agrotóxicos no Brasil e conexões com a União Europeia, com conclusões na mesma linha.
Segundo a pesquisa de Bombardi, venenos proibidos pela União Europeia são usados na produção de soja, milho, algodão, café, cana de açúcar, fumo e até no amendoim, além de diversos outros produtos brasileiros que são vendidos para o bloco.
Na soja, pro exemplo, havia 150 tipos de agrotóxicos, 35 deles banidos em nações da Europa. Já o milho brasileiro carrega 32 venenos agrícolas que também não poderiam ser comercializado na região.
“O que a gente estava vendo antes é que a gente estava comendo venenos que outros países negam para a suas populações. O que a gente vê agora são esses venenos entrando na União Europeia. É alarmante, a gente tem um duplo padrão de uso e comercialização desses agrotóxicos”, afirma Marina Cortês.
Nações da UE não baniram fabricação
Parte da responsabilidade pela entrada dessas substâncias em solo europeu e pelo contínuo uso delas no Brasil está nos próprios países do bloco. Apesar de proibir o uso de determinados agrotóxicos, as nações da UE não baniram a fabricação. O que é produzido por lá, é despejado nas lavouras daqui.
“A UE assina um acordo do clima, mas depois assina um acordo com o Mercosul que vai trazer mais isenção de impostos para agrotóxicos. Ela proíbe esses agrotóxicos em solo europeu, mas permite que isso volte em forma de resíduos. Não faz sentido nenhum esse padrão duplo”, ressalta a pesquisadora.
Ela é veemente ao apontar que apenas uma solução global é capaz de barrar o ciclo. “O que a gente tem é uma continuidade de um colonialismo.”, afirma. “Compactuando com isso, a Europa acaba contribuindo com um modelo que deixa um rastro enorme de destruição”, enfatiza Marina.
Fonte: Brasil de Fato