Neuriberg Dias: Qual papel das comissões temáticas no Congresso?

As comissões temáticas são órgãos dentro das estruturas das 2 casas do Congresso Nacional — Câmara dos Deputados e Senado Federal —, que desempenham papel fundamental no aperfeiçoamento da democracia.

Essas comissões desempenham etapa crucial do processo legislativo federal, ao promoverem o exercício da cidadania e a participação da sociedade civil na elaboração das leis ou normatização das relações econômicas, sociais e políticas.

Os deputados e senadores que integram essas comissões recebem representantes da sociedade civil, fiscalizam as ações governamentais e aprovam proposições, muitas vezes de forma definitiva ou oferecendo subsídios para as decisões dos plenários, da Câmara e do Senado.

Na Câmara, funcionam 30 comissões permanentes, e no Senado, 17, divididas por áreas temáticas. Algumas, com atribuições específicas, como a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), e a CFT (Finanças e Tributação).

Outros colegiados
Além das comissões permanentes, o regimento interno permite — na Câmara e no Senado — a criação de colegiados temporários, mistos, especiais, de inquérito — CPI e CPMI —, e externas. Além de grupos de trabalho e subcomissões.

No entanto, esse papel tem sofrido, ao longo dos anos, profunda modificação, em particular nas legislaturas anterior e na atual, especialmente, na Câmara dos Deputados, com o uso de expedientes que empoderam mais ainda o plenário no processo decisório.

Isso pode ser observado nos dados da produção legislativa de 2023, que revelam que 70% das leis incorporadas ao ordenamento jurídico foram votadas diretamente no plenário, com urgência. Enquanto, apenas 30% foram conclusivas nas comissões permanentes, principalmente matérias relacionadas às datas comemorativas ou homenagens.

Esses dados incluem matérias como medidas provisórias ou projetos de lei, com urgência constitucional, enviados pelo Poder Executivo, que agiliza a tramitação nas comissões técnicas.

Produção legislativa
Também é evidente a queda nas taxas de sucesso e na dominância do Poder Executivo no processo legislativo. Das leis aprovadas, 71% são de autoria dos próprios parlamentares, contra 26% propostas pelo chefe do Executivo.

O Poder Legislativo, agora mais fortalecido, ganhou destaque no debate político. Nada pode ser aprovado sem a participação do Congresso. Mas o Legislativo pode aprovar a própria pauta, sem, no entanto, depender do Executivo.

Outra explicação para essa mudança são as alterações regimentais que possibilitaram o aumento do número de comissões permanentes em funcionamento e a redução dos mecanismos utilizados pelas minorias e oposições para ampliar o debate das matérias submetidas ao plenário.

O que, em grande medida, prejudica debate mais amplo sobre os temas que impactam a sociedade.

Comissões temáticas com orçamento e mistas
A volta do funcionamento das comissões mistas para apreciar — debater e votar — as medidas provisórias, destaca essa nova postura no Legislativo. Quando a Câmara entrou em conflito com o Senado sobre a volta dos colegiados mistos, como forma de manter a ascendência sobre a agenda dentro do próprio Congresso e sobre os outros poderes, especialmente o Executivo, que tem priorizado o envio de projetos de lei para deliberação.

A disputa pelo comando dessas comissões técnica transformou esses espaços em verdadeiros palcos ideológicos. O que dificulta a promoção do debate técnico e a construção de consensos sobre cada tema submetido à votação nesses colegiados.

Já que agora também são cobiçadas pelo apetite financeiro, pois cada colegiado passa a administrar parte do Orçamento federal.

Composição, fragmentação e polarização
Esse novo elemento que compõe o debate em torno da composição das comissões reflete o próprio perfil dos eleitos para o Legislativo, a fragmentação partidária e a polarização política, que têm contribuído para essa centralização no controle da agenda legislativa.

Com a interrupção do debate, algumas frentes parlamentares têm organizado discussões temáticas, com grupos de interesse, pressão e lobby para influenciar as decisões políticas, em vez de confiar nas comissões técnicas, que têm o papel institucional de fazer esse trabalho, a fim de dirimir os temas que ali chegam.

Em última análise, as comissões da Câmara devem seguir o exemplo do Senado, que, independentemente do perfil da composição e decisões, têm sido ouvidas para qualificar o debate político e garantir a qualidade das leis submetidas às votações no plenário.

(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação licenciado do Diap. É sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.

FONTE: DIAP