Neuroinflamação, disfunção imunológica e alterações metabólicas estão entre as causas da fadiga pós-viral. Veja como diferenciar um cansaço comum de um problema crônico.
A recuperação de uma infecção viral, como a covid-19 ou a gripe, nem sempre significa um retorno imediato ao bem-estar. Para muitas pessoas, a fadiga extrema persiste mesmo após a fase aguda da doença, interferindo na rotina e na qualidade de vida. Mas por que isso acontece? E quando essa fadiga pode ser um sinal de alerta para condições mais graves?
Segundo a neurologista Flávia Esper Dahy, especialista pela Academia Brasileira de Neurologia e pesquisadora do projeto neuroCOVBR do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo, essa fadiga prolongada ocorre em até 80% dos casos após infecções virais e pode estar associada à encefalomielite miálgica, também conhecida como síndrome da fadiga crônica (uma doença neurológica crônica).
“Com a pandemia, o interesse por este tema aumentou, pois essa condição tem grande sobreposição com a síndrome pós-covid ou covid longa. Muitos estudos foram e ainda estão sendo desenvolvidos para esclarecer melhor essa relação e, na maioria deles, cerca de metade dos pacientes que tiveram covid-19 podem desenvolver a síndrome da fadiga crônica”, explica a especialista.
A fadiga é uma sensação persistente de cansaço, fraqueza ou falta de energia, que pode ser física, mental ou ambas. Em muitos casos, é resultado de esforço excessivo, sono inadequado, estresse ou alimentação desequilibrada, sendo resolvida com descanso e hábitos saudáveis.
No entanto, ela se torna preocupante quando é intensa, prolongada e não melhora com o repouso, podendo indicar problemas de saúde como distúrbios do sono, anemia, doenças da tireoide, depressão ou até condições mais graves, como doenças autoimunes, infecções virais e câncer.
A causa exata ainda é desconhecida, mas há disfunções nos sistemas neurológico, imunológico, endocrinológico, cardiovascular e metabólico que ajudam a rastrear a condição.
Diversos fatores podem contribuir para a persistência do cansaço. Entre os principais mecanismos biológicos envolvidos estão:
Além disso, a dra. Flávia ressalta que podem ocorrer anormalidades vasculares e endoteliais, como glóbulos vermelhos deformados e redução do volume sanguíneo, fatores que agravam a intolerância ao exercício físico.
A neurologista explica que a síndrome da fadiga crônica é caracterizada por uma redução substancial na capacidade de realizar atividades habituais por pelo menos seis meses. Já o cansaço profundo não é aliviado pelo descanso e pode ser incapacitante. Também é acompanhado por sintomas como:
Se a fadiga for intensa e prolongada, prejudicando a rotina diária, é fundamental procurar um especialista para investigação adequada antes que se desenvolvam outros problemas.
A fadiga pós-viral pode afetar qualquer pessoa, mas é mais comum em mulheres, com picos de diagnóstico entre 10 a 19 anos e 30 a 39 anos. Além disso, há maior incidência entre indivíduos que tiveram infecções por vírus Epstein-Barr, citomegalovírus, enterovírus e coronavírus, incluindo o Sars-CoV-2.
“Ela pode, também, estar relacionada a outros estressores fisiológicos, como cirurgia, trauma ou deficiências imunológicas, além de histórico preexistente ou familiar de doenças autoimunes, neurológicas ou outras doenças crônicas complexas multissistêmicas”, acrescenta a dra. Flávia.
Não há um exame específico para diagnosticar a fadiga, mas a avaliação médica é indispensável para excluir outras condições associadas. “O paciente deve ser avaliado por um médico habituado a lidar com essa condição para o diagnóstico correto e início de proposta terapêutica para melhora da qualidade de vida”, orienta.
Exames laboratoriais básicos e avaliações físicas detalhadas também são essenciais, considerando aspectos musculares, articulares, cardíacos, respiratórios e cognitivos. Também é preciso investigar a presença de comorbidades como depressão e fibromialgia.
A abordagem terapêutica para a fadiga pós-viral, como a que pode ocorrer após a covid ou uma gripe severa, é multifatorial e pode envolver:
“Entre as medidas comportamentais, destaco o pacing, que é uma estratégia de autogerenciamento de atividades – manter-se ativo quando capaz e descansar quando cansado.” Também é possível planejar períodos de descanso antes de atividades mais exaustivas pode ajudar na manutenção da energia ao longo do dia.
A fadiga extrema após infecções virais pode ser mais do que um efeito passageiro, em alguns casos, pode estar associada a outras condições ou síndromes que impactam a saúde geral do indivíduo. O acompanhamento médico adequado é crucial para um diagnóstico preciso e para a implementação de estratégias eficazes que promovam a recuperação e melhorem a qualidade de vida dos pacientes.
FONTE: DRAUZIO VARELLA